Uma startup incubada no Instituto de Pesquisa em Petróleo, Gás e Energia (LITPEG), da Universidade Federal de Pernambuco, planeja revolucionar o serviço de abastecimento de água, tornando as residências aptas a captarem e tratarem sua própria água. O modelo é semelhante ao do setor elétrico, onde os painéis solares instalados em telhados de residências captam e armazenam a energia solar.
A tecnologia desenvolvida pela startup Pluvi, projeto de doutorado do engenheiro civil Júlio Cesar Azevedo, inovou com o sistema de coleta, armazenamento e tratamento da água. Ela foi desenvolvida para ser empregada em casas situadas nos morros ou bairros da periferia, mas qualquer imóvel pode utilizá-la. As empresas Aqualito e InTime Solutions e o grupo de pesquisa do Laboratório de Computação Embarcada e Tecnologias Industriais (LACETI) da UFPE são parceiros no desenvolvimento tecnológico.
Nos morros do Recife, em média, apenas 30% dos moradores possuem caixas para armazenar água. “Setenta por cento não têm reservatórios, seja pelo custo ou porque a caixa é pesada e nem sempre pode ir para o telhado, o que exige a instalação de colunas de concreto. As colunas são pesadas e precisam ser transportadas por caminhão muque, que enfrenta dificuldade para subir nos morros”, explica Júlio Azevedo.
Como funciona
O sistema tradicional de coleta de chuva capta a água que cai do telhado numa calha, enviando-a para uma cisterna no solo. O diferencial do PluGow é que o sistema elimina a cisterna e encaminha a água para uma caixa suspensa. Isso faz muita diferença quando não se tem espaço para armazenamento no solo, como é o caso das casas de morros ou habitacionais de baixa renda.
O sistema da Pluvi armazena mil litros e pesa apenas 60 kg, podendo ser transportado por duas pessoas. Em formato de cálice, o recipiente tem seis metros de altura e uma base de apenas 25 centímetros, que é enterrada numa profundidade de 1 metro. Toda estrutura é vazada para armazenar a água captada por chuva.
Um acessório filtra a água recolhida nas calhas, dispensando o primeiro milímetro, que sempre chega sujo. Depois, ele bombeia a água para o reservatório. Tudo é movido por energia solar. “A água que chega às torneiras é para fins potáveis, como beber e cozinhar, e não potáveis – limpeza, lavagem de roupa e descarga sanitária, por exemplo.
Revolução
“Essa tecnologia vai revolucionar a relação das pessoas com a água. Ela resolve o problema da falta de água nos morros, contribui para reduzir riscos de deslizamentos e reduz o escoamento da água da chuva para a planície, diminuindo os alagamentos”, analisa Sávia Gavazza, vice-diretora do LITPEG e orientadora e mentora da Pluvi.
A escassez é um grande problema. Há localidades no Recife e no interior em que a água só chega a cada 15 dias. “As pessoas não tem água para banho, para lavar mãos, pratos, roupas. Aos mesmo tempo, no Recife chove todos os meses – uns mais, outros menos”, diz Gavazza.
A média anual é de dois mil milímetros. “Uma casa com um telhado de 100 m² consegue juntar 200 mil litros por ano, o que equivale ao consumo médio de uma família. O Pluvi PluGow dará às pessoas vítimas da escassez mais autonomia”, diz Azevedo.
“Em 2017, a Lei 13.501 incluiu o incentivo à captação de água de chuva na Política Nacional de Recursos Hídricos. Depois veio o Novo Marco do Saneamento e disse que esse recurso hídrico pode ser trabalhado pela inciativa privada. Então, estamos trazendo para a inciativa privada uma oportunidades de negócio”, disse o doutorando.
A Pluvi está na fase de amadurecimento do projeto. Após negociação com a Prefeitura do Recife, a startup pretende rodar um piloto no Córrego da Telha, no bairro da Guabiraba. A localidade foi indicada pela Defesa Civil porque apresenta alto risco de deslizamentos. Ela também, vem testando a tecnologia num habitacional na cidade de Caruaru, no Agreste pernambucano, em parceria com a empresa Viana e Moura. Nesta fase, ela conta com recursos da Facepe, a Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco.
Política pública
O grande objetivo da Pluvi é que a sua solução faça parte da política pública para o abastecimento de água, levando mais dignidade às pessoas. “Nós precisamos nos apropriar da matriz da água assim como fizemos com a energética”, diz Azevedo, para quem o sistema convencional de abastecimento de água chegou ao seu limite.
Neste sentido, a Pluvi quer levar a inovação ao programa habitacional Casa Verde Amarela. Isso porque, muitas casas de empreendimentos habitacionais populares são erguidas em localidades distantes dos centros urbanos onde não chega água. A ideia é fazer com que a Caixa Econômica incorpore a tecnologia ao financiamento.
“No Sul do Brasil, os financiamentos já incluem aquecimento no chuveiro. Hoje, cada kit da Pluvi sai ao custo de R$ 6 mil reais. E isso não representa muito num financiamento de R$ 200 mil”, calcula Azevedo.
Há um outro desafio a ser superado pela Pluvi, que é fazer com que as pessoas valorizem esse recursos hídrico. “Nas grandes cidades, as pessoas tratam água de chuva como se fosse esgoto, enquanto no Sertão, tratam como ouro”, analisa Azevedo.
A Startup também verificou, através de pesquisa, que as pessoas não bebem água de chuva porque pensam que ela é ácida. “A acidez da água da chuva é menor do que a acidez da água mineral que se consome em garrafões. Esse é um mito que precisamos desconstruir”, explica Azevedo, enquanto bebe um gole de água da chuva captada pela Pluvi através do telhado do LITPEG.
FONTE: ME / / TEXTO: Patricia Raposo