Imagine uma cidade inteira desaparecendo sob as águas. Igrejas, praças, ruas, memórias. No Nordeste brasileiro, isso aconteceu mais de uma vez. A construção de grandes barragens e usinas hidrelétricas nas últimas décadas mudou a paisagem de sertões inteiros — e transformou cidades inteiras em ruínas submersas.
Esse é o caso de lugares como Petrolândia (PE) e Canindé de São Francisco (SE), onde a água chegou para gerar energia e garantir abastecimento, mas também levou embora histórias, casas e modos de vida. Apesar das perdas, algumas dessas cidades resistem na memória dos moradores e, hoje, são até pontos turísticos alternativos — verdadeiras Atlântidas sertanejas.
Vidas que foram inundadas
A construção de barragens é, muitas vezes, celebrada como sinônimo de progresso. Mas ela vem com um custo social e afetivo: o deslocamento forçado de milhares de famílias. Em Petrolândia, por exemplo, a antiga cidade foi alagada na década de 1980 para dar lugar ao reservatório da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga. Moradores foram reassentados, mas até hoje lembram das ruas onde cresceram — agora invisíveis sob a água.

Já em Canindé de São Francisco, o rio São Francisco engoliu parte da cidade com a construção da Usina de Xingó. Algumas estruturas antigas ainda reaparecem em épocas de seca, como ruínas de igrejas e cemitérios, criando um cenário ao mesmo tempo melancólico e fascinante.
Cidades que o sertão perdeu (ou quase)
A tabela abaixo apresenta algumas das cidades nordestinas que foram parcial ou totalmente submersas:
Cidade | Estado | Barragem/Usina | Década da inundação | O que ainda pode ser visto hoje |
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Petrolândia | PE | Usina Hidrelétrica Luiz Gonzagaa | 1980 | Igreja do Sagrado Coração parcialmente submersa |
Canindé de São Francisco | SE | Usina Hidrelétrica de Xingó | 1990 | Ruínas na seca, cânions e museu arqueológico |
Remanso (antiga sede) | BA | Barragem de Sobradinho | 1970 | Cidade reconstruída, memórias preservadas |
Casa Nova (antiga sede) | BA | Barragem de Sobradinho | 1970 | Parte das ruínas visível em período de estiagem |
Pilão Arcado (parte antiga) | BA | Barragem de Sobradinho | 1970 | Áreas rurais inundadas, história oral preservada |
Jatobá | PE | Usina Hidrelétrica de Moxotó | 1970 | Região rural alagada, população reassentada |
Turismo entre memórias e águas
Apesar do passado marcado por perdas, algumas dessas regiões estão se reinventando. Em Petrolândia, a igreja submersa virou cartão-postal e tem visitação constante de turistas em passeios de lancha e caiaque. Em Canindé de São Francisco, os cânions do São Francisco se tornaram uma das atrações naturais mais impactantes do Nordeste.
Além das belezas naturais, há uma forte carga simbólica: visitar esses lugares é mergulhar — literalmente — em pedaços de história que submergiram à modernidade.
Quando a água leva, mas a memória fica
As cidades submersas do Nordeste são lembranças de um tempo que não volta, mas também mostram a força da memória coletiva. Seus moradores reconstruíram suas vidas, mas nunca esqueceram o que ficou para trás. E quando o nível da água baixa e ruínas voltam à tona, é como se o passado pedisse passagem nas lembranças históricas.
Homenagem que virou sucesso
Os cantores e compositores Sá e Guarabyra fizeram uma homenagem a essas cidades. A música terminou sendo um grande sucesso.
Sobradinho
Tira gente, põe represa, diz que tudo vai mudar
O São Francisco lá pra cima da Bahia
Diz que dia menos dia vai subir bem devagar
E passo a passo vai cumprindo a profecia do beato que dizia que o Sertão ia alagarO sertão vai virar mar, dá no coração
O medo que algum dia o mar também vire sertãoAdeus Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Adeus Pilão Arcado vem o rio te engolir.
Por cima da cachoeira o gaiola vai, vai subir
Vai ter barragem no salto do Sobradinho
E o povo vai-se embora com medo de se afogar.Remanso, Casa Nova, Sento-Sé
Pilão Arcado, Sobradinho
Adeus, Adeus.