Estudo recente do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) aponta que o Brasil poderá mais que dobrar a oferta de biocombustíveis até 2050 sem invadir áreas de vegetação nativa, aproveitando entre 20 e 35 milhões de hectares de pastagens degradadas, dentro de um total de cerca de 100 milhões disponíveis. Com isso, o consumo de biocombustíveis saltaria de 102 milhões de toneladas equivalentes de petróleo (Mtep) em 2024 para 221,1 Mtep em 2050.
Uma pergunta natural é: como o Nordeste pode ajudar e se beneficiar desse ambicioso cenário?

A seguir, os principais pontos:
Conheça o Potencial existente no Nordeste
- Produção já relevante de bioenergia
O Nordeste contribui de forma significativa para a produção de bioenergia no Brasil. Em 2024, estados como Alagoas, Pernambuco e Bahia se destacaram na geração de bioeletricidade a partir do bagaço da cana. Alagoas, por exemplo, foi responsável por cerca de 27% da produção regional. - Agricultura familiar e oléaginosas locais
Há iniciativas no Nordeste com culturas como mamona, girassol e palma (maçuába) que se adaptam bem ao clima semiárido. O programa de biodiesel social, selo biocombustível social, prevê apoio maior para a agricultura familiar no Nordeste. - Pesquisa, inovação e biofábricas
Centros como o CETENE e projetos como a biofábrica de Pernambuco atuam no melhoramento genético, micropropagação de cana e outras cultivares para uso energético. Isso favorece produtividade e torna mais competitiva a oferta de matéria-prima para biocombustíveis. - Uso de áreas degradadas
Muitas regiões nordestinas possuem terras degradadas ou pouco produtivas (solo erodido, pastagens degradadas). O uso dessas terras para plantio de culturas energéticas (respeitando as condições ambientais) poderia fazer parte desse incremento de oferta sem comprometer florestas intactas. O estudo do Iema permite evitar uso de vegetação nativa.
Benefícios esperados para o Nordeste
- Geração de emprego e renda — expansão das cadeias produtivas de biocombustíveis pode empregar agricultores familiares, pequenos produtores, beneficiadores locais (ex: cultivo, colheita, processamento).
- Desenvolvimento regional equilibrado — com incentivo e políticas adequadas, região menos favorecida pode atrair investimentos industriais e tecnológicos ligados à bioenergia e aos biocombustíveis.
- Redução de desigualdades — potencial para melhorar infraestrutura rural, aumentar segurança alimentar (quando cultivadas culturas de subsistência em consórcio), melhoria nas redes logísticas e de transporte.
- Contribuição para metas climáticas — produzindo combustível limpo, reduzindo emissões de CO₂, contribuindo para os compromissos do Brasil no Acordo de Paris e nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC).
Desafios e condições para o sucesso
- Infraestrutura de transporte e logística — para escoamento da produção (estradas, armazenamento, proximidade de usinas) são essenciais para tornar viável o custo de produção.
- Acesso a crédito e financiamento para pequenos produtores — para compra de mudas, maquinário, irrigação, tecnologia. Sem suporte financeiro, produção local pode ficar marginalizada.
- Políticas de incentivo e regulação adequadas — definições claras sobre o uso da terra, garantias ambientais, legislação sobre selo social, mistura obrigatória de biodiesel/etanol, apoio fiscal.
- Concorrência com a produção de alimentos — evitar que culturas energéticas “desloquem” aquilo que era usado para alimento ou conservação ambiental. Bons arranjos agroflorestais e consórcios podem ajudar.
- Adaptabilidade climática e uso sustentável da água — no semiárido nordestino, escassez de água é uma variável crítica. Opções de cultivares resistentes, sistemas de irrigação eficientes, aproveitamento de águas residuais ou tecnologias de manejo serão importantes.
Exemplos de ações já em curso
- Selo Biocombustível Social reforçado para estimular biodiesel oriundo de agricultura familiar do Nordeste, com mistura obrigatória maior.
- Sistemas agroflorestais com macaúba em Piauí e Ceará, integrando culturas alimentares e de energia, demonstrando modelos sustentáveis de produção em consórcio.
- Biofábrica do CETENE/Embrapii que propaga mudas de cana de açúcar e outras fontes energéticas, aumentando eficiência produtiva.
Como o Nordeste pode acelerar a transição

Portanto, para que o Nordeste não apenas “ajude”, mas seja protagonista nesse cenário de crescimento dos biocombustíveis até 2050, algumas linhas de ação parecem essenciais:
- Focar em políticas públicas regionais específicas, com incentivos para produtores nordestinos, integrando biodiversidade, uso sustentável da terra e acesso a mercados.
- Apoiar pesquisa e inovação local: mudas mais produtivas, cultivares adaptadas ao clima semiárido, métodos de produção sustentável (agroflorestais, consórcios).
- Garantir crédito acessível, logística e infraestrutura adequada para escoamento.
- Fortalecer o Selo Biocombustível Social, para que a economia familiar e comunidades locais obtenham parte expressiva dos benefícios.
- Incluir articulação entre governo federal, estadual e municipal, instituições de pesquisa, setor privado e agricultores para viabilizar o investimento.
O Nordeste é a região com maior potêncial para biocombustíveis no Brasil. Acredito que se o poder público manter o foco em politicas públicas com esse foco, a região vai colher grandes frutos em breve.
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