Os dados mais recentes do MapBiomas, divulgados nesta quarta-feira (1º), pintam um quadro de transformação radical e alarmante para o Cerrado. Nos últimos 40 anos, o bioma que ocupa quase um quarto do território nacional perdeu 28% de sua vegetação nativa, o equivalente a 40,5 milhões de hectares. Quando somamos à área já transformada antes de 1985, quase metade (47,9%) do Cerrado original já foi alterado.
Diante desse cenário, um conjunto de estados ganha importância crítica: o Matopiba, acrônimo formado por Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A princípio, esta região é a última grande fronteira agrícola do país e, ao mesmo tempo, a principal guardiã do que restou do Cerrado.
A Dupla Face do Matopiba
Enquanto o bioma como um todo encolhe, o Matopiba se tornou um epicentro paradoxal. A região concentra 30% de toda a área do Cerrado brasileiro e abriga a maior parte da vegetação nativa remanescente. No entanto, foi justamente nessa região que a devastação mais avançou na última década.
Entre 2015 e 2024, o Matopiba foi responsável por 73% de toda a conversão de vegetação nativa do bioma para uso humano. Sozinha, a região respondeu pela supressão de 4,7 milhões de hectares dos 6,4 milhões de hectares perdidos no Cerrado nesse período.
O Avanço da Agricultura e a Mudança na Paisagem
Ao mesmo tempo, a principal força por trás dessa transformação é a agricultura, que expandiu seu território em impressionantes 533% desde 1985. As lavouras temporárias, como a soja, já ocupam 25,6 milhões de hectares no bioma. As pastagens, que ainda são a cobertura predominante (24,1% do território), pararam de crescer e vêm perdendo espaço justamente para a agricultura.
A Importância e a Pressão sobre o Matopiba
A tabela abaixo sintetiza a posição central dos estados do Matopiba, com destaque para Bahia, Maranhão e Piauí, na conservação e na devastação do Cerrado:
Indicador | Situação no Cerrado | Contexto no Matopiba (MA, TO, PI, BA) |
---|---|---|
Área Total do Bioma | 23,3% do território nacional. | Concentra 30% de toda a área do Cerrado. |
Vegetação Remanescente | Maior parte está no Matopiba. | Bahia, Maranhão e Piauí são guardas principais deste estoque. |
Perda em 40 anos | 40,5 milhões de hectares (28% do bioma). | Perdeu 15,7 milhões de hectares nesse período. |
Pressão Recente (2015-2024) | 6,4 milhões de hectares perdidos. | Responsável por 73% da perda recente (4,7 mi/ha). |
Atividade de Maior Expansão | Agricultura (+533% desde 1985). | Avançou sobre 5,5 milhões de hectares na região. |

Boa parte da vegetação do Cerrado acaba dando lugar à agricultura.
Água, Habitats e o Contraste da Preservação
Assim, os impactos vão muito além das árvores no chão. Bárbara Costa, analista do IPAM e do MapBiomas, alerta para mudanças no regime hídrico e maior vulnerabilidade a extremos climáticos. O Cerrado, conhecido como “berço das águas” por abrigar nascentes de importantes bacias hidrográficas, viu suas formações savânicas e florestais, essenciais para a infiltração da água, serem drasticamente reduzidas.
O contraste na preservação é evidente: enquanto Territórios Indígenas mantêm 97% de sua vegetação nativa e Unidades de Conservação 95%, os imóveis rurais preservam, em média, apenas 45% de suas áreas.
Em suma, a história recente do Cerrado é a história do Matopiba. A preservação do que resta desse bioma fundamental depende, diretamente, de como os estados da Bahia, Maranhão, Piauí e Tocantins conduzirão seu desenvolvimento. Dessa forma, o desafio é conciliar a potência agrícola com a conservação do ecossistema que a sustenta.