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Cotidiano

APA de Santa Rita: proteção, desafios e papel estratégico no litoral alagoano

A APA de Santa Rita protege um mosaico de ecossistemas costeiros e lagunares.
Eliseu Lins, da Agência NE9
30 de setembro de 2025 - às 10:30
Atualizado 30 de setembro de 2025 - às 10:30
6 min de leitura
A área leva o nome da Ilha de Santa Rita, a maior ilha lacustre do Brasil foto Neno Canuto
A área leva o nome da Ilha de Santa Rita, a maior ilha lacustre do Brasil foto Neno Canuto

A Área de Proteção Ambiental (APA) de Santa Rita, gerida pelo Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL), é a unidade de conservação estadual mais antiga de Alagoas. A principio, criada pela Lei Estadual nº 4.607/1984, foi instituída com o propósito de preservar os ecossistemas dos canais e lagunas Mundaú e Manguaba, organizando o uso territorial e assegurando a proteção ambiental para os municípios de Maceió, Marechal Deodoro, Coqueiro Seco e Santa Luzia do Norte.

A APA possui cerca de 10.230 hectares (ou 102,3 km²) de extensão territorial.

Importância ecológica e paisagens

A APA de Santa Rita protege um mosaico de ecossistemas costeiros e lagunares. Entre os principais elementos naturais presentes:

  • Ilha de Santa Rita: considerada a maior ilha lacustre do Brasil, com cerca de 1.260 hectares inseridos no sistema lagunar.
  • Manguezais e canais interlagunares: rede de mangue, canais, pequenas ilhas e conectividade hidrográfica entre Mundaú e Manguaba.
  • Restingas e cordões arenosos: zona costeira com vegetação adaptada a solos arenosos, atuando como barreiras naturais.
  • Matas de encosta, várzeas e recifes costeiros: diversidade de habitats entre áreas úmidas, encostas e contornos costeiros com recifes.

A APA faz parte do Complexo Estuarino Lagunar Mundaú-Manguaba (CELMM), um sistema hídrico e ecológico com alta influência ambiental na dinâmica costeira de Alagoas.

Além disso, a APA engloba dentro de seus limites a Reserva Ecológica do Saco da Pedra, em Marechal Deodoro, com cerca de 90 hectares de área protegida local.

Objetivos e plano de manejo

Funções e objetivos

A APA de Santa Rita foi criada com atribuições que vão além da proteção paisagística:

  • Ordenar o uso do solo de forma sustentável, definindo os limites de ocupação, áreas prioritárias para conservação e uso preservacionista.
  • Proteger a fauna e a flora locais – residentes e migratórias, assegurando ambientes de reprodução e refúgio.
  • Preservar a qualidade da água, evitar degradações nas margens, recifes, canais e desembocaduras.
  • Sustentar modalidades de uso local tradicional: pesca artesanal, atividades agrícolas familiares, extrativismo leve, turismo de baixo impacto.
  • Evitar a urbanização desordenada e intervenções que comprometam os ecossistemas costeiros.

Plano de Manejo e zoneamento

A APA de Santa Rita possui uma 2ª edição do Plano de Manejo, que atualiza o zoneamento interno, define normas e restrições para diferentes usos dentro da unidade.

Com a revisão mais recente, houve avanços na gestão, visando minimizar conflitos entre ocupações humanas e conservação ambiental. Dessa maneira, o instituto adotou metodologia inspirada nos planos do ICMBio para unidades federais, adaptando às demandas locais.

O novo plano permite definir prioridades, áreas vulneráveis, áreas de uso restrito e áreas de uso sustentável, com instrumentos técnicos e participação da comunidade.

Leila Salustiano é gestora da Área de Proteção Ambiental de Santa Rita  foto Edvan Ferreira
Leila Salustiano é gestora da Área de Proteção Ambiental de Santa Rita foto Edvan Ferreira

Desafios e ameaças

Apesar de criada para proteger, a APA enfrenta diversos desafios reais:

Desafio / AmeaçaDetalhamento
Urbanização descontroladaExpansão de loteamentos, construções irregulares, alterações no uso do solo ameaçam vegetação nativa e fragmentam habitats.
Zoneamento frágil / défice de fiscalizaçãoO zoneamento teve versões preliminares ainda em 1993 e, até meados de anos recentes, a efetiva fiscalização ficou “no papel”, com limitações de atuação prática.
Pressão sobre recursos hídricos e canaisAlterações nas margens, dragagens, assoreamento, poluição dos canais interlagunares impactam a conectividade e sobrevivência dos organismos aquáticos.
Perda de flora, fragmentação e invasõesA vegetação de restinga, mangue e áreas naturais sofre com degradação, espécies invasoras e perda de biodiversidade especialmente nas bordas da APA.
Conflitos com usos tradicionaisOs moradores locais que dependem de pesca, agricultura e extrativismo podem entrar em conflito com normas restritivas e limitações impostas.
Governança e participação comunitária limitadaA efetividade da APA depende da participação ativa dos moradores, fiscalização constante, recursos institucionais e integração interinstitucional — que nem sempre são plenamente garantidos.

Um artigo de mapeamento geomorfológico registrou que a APA já se configura como área bastante urbanizada e de ocupação desorganizada, evidenciando perda de algumas espécies vegetais e impactos acumulados na paisagem natural.

Pesquisadores já apontaram que o zoneamento preliminar era precário e que a apresentação do plano de manejo, embora em 2004, demorou para ser operacionalizado.

Ações e participação local

Para fortalecer a proteção da APA, algumas iniciativas e estratégias têm sido adotadas:

  • Oficinas de cartografia social e mapeamento participativo: promovidas por universidades e instituições ambientais, essas atividades envolvem moradores locais para levantar percepções, mapear riscos e contribuir com planejamento territorial. Um exemplo é o projeto EducAPA, coordenado pela UFAL, que realizou oficinas com comunidades da APA para cartografia social.
  • Revisões e ajustes do plano de manejo: atualização do zoneamento e colaboração entre técnicos do IMA e o Conselho Gestor, buscando uma gestão mais técnica e assertiva.
  • Educação ambiental e projetos culturais: estímulo ao conhecimento local para que as pessoas entendam que vivem dentro de uma unidade de conservação, participem da fiscalização e sejam agentes de preservação.
  • Fiscalização articulada e monitoramento: reforço de mecanismos legais, vigilância de ocupações irregulares, ações punitivas para infrações ambientais.

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A APA de Santa Rita representa um dos marcos ambientais de Alagoas: histórica, extensa e complexa, ela protege ecossistemas costeiros e lagunares que são vitais para a vida e para o equilíbrio ambiental da região. Além disso, seu desafio é grande, pois lida com pressões urbanísticas, conflitos de uso e limitações institucionais.

Mas existe também potencial: com plano de manejo atualizado, envolvimento comunitário e fiscalização firme, pode servir como modelo de conservação costeira sustentável. Portanto, preservar a APA é preservar serviços ambientais, modos de vida tradicionais e a identidade natural do litoral alagoano.

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Eliseu Lins

Eliseu Lins é baiano de nascimento e paraibano de coração. Jornalista formado na UFPB, tem mais de 20 anos de atuação na imprensa do Nordeste. É pós-graduado em jornalismo cultural e ocupa o cargo de editor-chefe do NE9 desde 2022.