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Com a promessa de plugar de vez a economia, 5G vai a leilão

Realidade em 65 países e 1.662 cidades, a telefonia móvel de quinta geração dará o seu primeiro grande passo no Brasil em uma concorrência marcada para o próximo dia 4. Às 10h, na sede da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em Brasília, os envelopes com as propostas das empresas habilitadas a concorrer em diferentes modalidades de operação e localidades começarão a ser abertos.

Além de grandes operadoras já atuando na telefonia brasileira, como Claro, TIM e Telefônica (Vivo), o leilão pode ter a participação de outras 12 empresas. A Algar e a Sercomtel, de médio porte, também já operam no país. As outras dez concorrentes estrearão no mercado: Brasil Digital Telecomunicações Ltda; Brisanet Serviços de Telecomunicações SA; Cloud2U Indústria e Comércio de Equipamentos Eletrônicos Ltda; Consórcio 5G Sul; Fly Link Ltda; Mega Net Provedor de Internet e Comércio de Informática Ltda; Neko Serviços de Comunicações, Entretenimento e Educação Ltda; NK 108 Empreendimentos e Participações SA; VDF Tecnologia da Informação Ltda; e Winity II telecom Ltda.

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Mesmo tendo apresentado propostas, as competidoras que não cumprirem todas as exigências do Edital 1/2021 serão excluídas — e seus envelopes, devolvidos intactos.

A expectativa é de que o Tesouro Nacional arrecade R$ 3,06 bilhões, caso os lotes sejam leiloados na sua totalidade. Esses recursos, relativos às outorgas, terão um impacto direto nas finanças do governo, mas é possível que até R$ 49,7 bilhões sejam movimentados com a venda dos espaços de radiofrequência em 5G, sendo R$ 7,57 bilhões para atender à demanda de internet para rede de educação básica. Outros R$ 39,1 bilhões compõem o restante dos investimentos obrigatórios constantes do edital, incluindo uma rede exclusiva para a área governamental em Brasília.

A licitação, que será dirigida a radiofrequências nas faixas de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz, com prazo de operação de 20 anos prorrogável por mais 10, teve como primeiro horizonte o mês de novembro do ano passado e só foi marcada em definitivo depois de correções no edital determinadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo a Anatel, “será a maior oferta de espectro da história da agência”. Mas a princípio só serão beneficiadas as capitais e as grandes cidades.

Podem participar do certame empresas constituídas segundo as leis brasileiras, com sede e administração no país, em que a maioria das cotas ou ações com direito a voto pertença a pessoas naturais residentes no Brasil, inclusive as que explorem serviço de telecomunicações, individualmente ou em consórcio. As estrangeiras estão autorizadas, desde que firmem compromisso de se adaptarem às características exigidas.

Entre as principais novidades da tecnologia 5G, estão a transmissão de altas taxas de dados e em baixa latência, ou seja, no menor espaço de tempo possível, com segurança e confiabilidade. Na ampla gama de possibilidades a serem exploradas, há aplicações eficientes para o desenvolvimento de serviços destinados a diversas atividades econômicas e pessoas físicas, como operação remota de máquinas, operação de máquinas por outras máquinas, procedimentos em telemedicina e transmissão de vídeos em alta resolução.

          

Escalada tecnológica
Na trajetória das tecnologias móveis de telefonia, cada geração voltou-se para uma determinada abordagem, quase sempre tendo em vista um usuário humano. A primeira geração oferecia cobertura de telefonia utilizando torres. Nessa época, os celulares funcionavam basicamente como rádios de comunicação em FM (algo como os folclóricos walkie talkies) e tinham de ser conectados a redes de telefonia fixa.

O 2G foi a primeira tecnologia a inserir a telefonia no campo das comunicações móveis, com modestas taxas de transmissão de dados, que não comportavam arquivos grandes e ainda podiam incluir opções de sons de chamada e mensagens de texto. O 3G propiciou ao usuário usar dados no celular como se fosse numa conexão de banda larga fixa em um computador. Surgiram nessa etapa ofertas pioneiras e criou-se o ambiente para o desenvolvimento de novos ramos da economia digital.

O 4G formatou o mundo em que nos comunicamos atualmente, ao aumentar a velocidade da transmissão de dados e facilitar as conexões em redes velozes na maior parte do tempo. Com isso, serviços que estavam limitados ao atendimento físico migraram para a esfera digital: da entrega de comida ao táxi. Os compartilhamento de vídeos em alta definição, mas principalmente as redes sociais, são os grandes destaques de aplicações dessa geração.

Conforme a Anatel, o 5G “trará mudanças mais profundas para aplicações industriais e de automação do que para usuários de smartphones”. Estes terão disponíveis taxas de transmissão média e de pico muito superiores ao 4G, mas a grande inovação é esperada para as aplicações industriais e comerciais, como os carros autônomos e os sensores, além de uma melhor cobertura em rodovias, o que deve favorecer especialmente o transporte de cargas.

É a chamada Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês), que deverá ser atendida de forma massiva, com grande cobertura e baixo consumo de bateria, levando a um novo patamar de comunicabilidade.

Devido ao seu padrão tecnológico, que inclui maior sustentação e um tempo de resposta superior, o 5G ainda promete fazer avançar serviços como a segurança pública, a educação à distância e as cidades inteligentes.

São esperados igualmente avanços como a maior densidade das conexões, isto é, o aumento da quantidade de dispositivos conectados em uma determinada área; maior eficiência espectral, que é o aumento da quantidade de dados transmitidos por unidade de espectro eletromagnético; e maior eficiência energética dos equipamentos, com redução do consumo de energia e, consequentemente, reflexos na sustentabilidade ambiental.

A tecnologia 5G implicará um salto adicional, já que é flexível e se adapta à aplicação utilizada. Uma de suas funcionalidades é o “fatiamento da rede” (network slicing). Vídeos de alta resolução (4K, por exemplo) podem pedir larguras de banda extremamente altas, enquanto carros autônomos e cirurgias assistidas demandam latências (tempo de resposta) extremamente baixas. Em vez de obrigar todas as aplicações aos mesmos parâmetros de rede, o fatiamento permite ao provedor isolar virtualmente os segmentos de rede necessários para atender às necessidades de uma aplicação, otimizando os resultados.

Inclusão digital
O acesso às vantagens do 5G, entretanto, só serão possíveis por meio de um aparelho compatível com a nova tecnologia. Os requisitos para a certificação de tais aparelhos para a rede 5G já foram aprovados pela Anatel. Assim, espera-se que haja o crescimento da oferta de modelos adequados. Segundo a Anatel, o primeiro smartphone homologado compatível com a tecnologia 5G no Brasil foi lançado no final de junho de 2020. Mas, sem as novas redes, os benefícios ainda são pequenos. Redes de 4G e 3G ajustadas não são mais do que simulacros do que o 5G poderá de fato oferecer. De qualquer forma, por um bom tempo, os celulares compatíveis com as gerações 2G, 3G e 4G continuarão funcionando.

Apesar da garantia de sobrevida para tecnologias mais antigas, a implantação das redes móveis de quinta geração ainda não dissipou as dúvidas sobre o quanto ela fará avançar o acesso à telefonia móvel para os usuários que vivem em áreas remotas do Brasil. Uma série de questões relacionadas a esse tema foram colocadas por especialistas e senadores que participaram, no dia 28 de outubro, de uma audiência pública promovida pela Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado (CCT).

Além de amplificar os alertas para os riscos que corre a inclusão digital no país, o encontro também teve o objetivo de coletar subsídios à avaliação da política pública de telefonia celular 5G — essa avaliação está a cargo da CCT. Até o final do ano, o senador Jean Paul Prates (PT-RN) deve apresentar um relatório sobre a implantação dessas redes no Brasil.

Apesar de reconhecer a importância da nova tecnologia, Jean Paul observa que o assunto ainda é objeto de críticas e perguntas até agora sem respostas:

— Vai ser importante saber como ficará o cidadão comum lá do interior. Quando ele terá acesso a essa tecnologia? Como ele ficará servido das tecnologias que já estão ofertadas, mas com baixa qualidade? Quando e como essas tecnologias vão proporcionar maior bem-estar social e melhor qualidade de vida a esses cidadãos?

Para o senador Paulo Rocha (PT-PA), o que se insinua é o velho costume de transferir para a iniciativa privada serviços públicos essenciais, mas sem atrelar a exploração de áreas mais lucrativas a investimentos para o público de menor renda:

— Volta de novo a volúpia de governos nesse processo de discussão de privatização, especialmente em serviços públicos tão importantes. Estou aqui desde 1991 e participei de todo esse debate, principalmente na privatização das telecomunicações. As empresas vão exatamente em busca do filé. E o osso fica para quem? O serviço privado não deu conta de resolver os problemas dos rincões do país.

Na opinião de Alex Jucius, diretor da Associação NEO, que reúne 180 pequenas e médias prestadoras independentes de banda larga, TV por assinatura e telefonia fixa e móvel, a execução dos compromissos vai acelerar a inclusão digital. Segundo ele, mais de 500 municípios com até 600 habitantes e cerca de 2 mil municípios sem cobertura plena passariam a ser atendidos pelo menos com redes 4G. Além disso, a internet chegaria a 48 mil quilômetros de rodovias federais:

— A inclusão digital não necessariamente vai ser feita com o 5G. Mas pode ser feita por meio do 5G, com os investimentos decorrentes e os compromissos que estão sendo colocados. A implantação da tecnologia 4G e LTE vai ser levada para lugares que hoje não estão cobertos. O 5G vai talvez promover a maior inclusão digital que já houve neste país com relação à mobilidade.

Cristiane Sanches, conselheira da Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), acredita que o edital do leilão vai equilibrar o atendimento às capitais e ao interior:

— O edital permite que a gente tenha acesso a redes neutras. O futuro do espectro é o compartilhamento. Se não tivermos esse compartilhamento e um acesso diferenciado à rede móvel, nada vai funcionar e o interior vai restar prejudicado. Ainda existem lacunas em relação a localidades remotas e afastadas, e não é o 5G, nesse momento inicial da operação, que vai resolver isso.

Essa é também a previsão do diretor do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), Gustavo Correa:

— O Fórum Econômico Mundial reconhece que o 5G tem uma curva de adoção que começa pelas grandes cidades, por áreas mais urbanas. À medida que o tempo passa, a gente vai conseguindo ter essa cobertura fora dos grandes centros e até mesmo em áreas rurais e remotas. O investimento nas redes 5G, para que elas cheguem a áreas menos densamente povoadas, é maior, o que leva a um prazo de adoção maior.

A Coalizão Direitos na Rede, que reúne 48 associações que defendem o direito à comunicação e à inclusão digital, é bem crítica em relação ao edital da Anatel. Flávia Lefevre, representante da entidade, mencionou na audiência no Senado o relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) que apontou falhas na elaboração do documento:

— A pergunta é: 5G para quem? As entidades reconhecem nessa tecnologia grandes oportunidades de alavancar diversos setores da economia e estimular o desenvolvimento social. Mas o Brasil se encontra hoje num fosso digital profundo e injustificável.

Um dos “erros grosseiros” do edital seria considerar como economicamente inviáveis para o 5G uma série de municípios grandes, populosos e, em alguns casos, de alto poder aquisitivo.

Diogo Moyses, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), teme que parcela importante dos consumidores brasileiros possa ser prejudicada pelo modelo de leilão do próximo dia 4.

— O consumidor, especialmente aquele mais vulnerável e que mais precisa de políticas públicas, está sendo desconsiderado nesse processo. Evidente que o 5G traz uma série de inovações. Mas a situação em relação à universalização do acesso à internet ainda é dramática. Aproximadamente 40% da população tem acesso à internet exclusivamente pela telefonia móvel. É um modelo comercial baseado em franquias, no qual boa parte dos usuários passa a maior parte do mês sem qualquer acesso à internet. O foco deve ser uma melhoria radical da infraestrutura do 4G — sugeriu.

Fonte: Agência Senado

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